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  • Foto do escritorRogério Baptistini Mendes

A fome reclama política e determinação

Atualizado: 29 de jul.

A fome que aflige os brasileiros é ignominiosa, pois deriva de uma escolha política que favorece poucos ao custo do desespero da maioria.

Walter Belik, professor do Instituto de Economia da Unicamp.


A fome que voltou a infelicitar os brasileiros, ao ponto de se tornar um problema de saúde pública, não é resultado exclusivo da pandemia, mas de políticas deliberadas que inviabilizaram a agricultura familiar e subordinaram a produção do campo aos interesses do agronegócio.


Enquanto o desemprego explodia e a fome atingia pouco mais de 19 milhões de pessoas, segundo dados da Rede Brasileira de Soberania e Pesquisa em Segurança Alimentar e Nutricional, o PIB do agronegócio conheceu uma expansão recorde de 24,31% em 2020 (na comparação com 2019, conforme Comunicado Técnico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).


Não sofremos com falta de produção, mas com o abandono dos brasileiros. Não houve interesse por parte do governo em proteger os vulneráveis e combater a fome. No discurso e na prática tudo foi feito para favorecer os “de cima” e retirar as proteções dos trabalhadores e dos humildes: desregulamentações, ausência de políticas e de planejamento, defasagem na cobertura do Bolsa Família. Isso, somado ao desemprego crescente e à diminuição da renda, legaram o cenário atual.


É importante lembrar, entretanto, que o atual governo levou ao limite do paroxismo uma situação que já estava deteriorando desde o governo Dilma Rousseff. Nele teve início uma política de cortes de gastos e de paralisação da reforma agrária que iniciou a reversão na curva de combate à fome. Fato que foi agravado durante o governo Temer com os cortes promovidos no orçamento.


Para amenizar o problema da fome é preciso que o governo mantenha estoques reguladores de alimentos e atue para controlar os preços interferindo no mercado. Ou seja: compre para formar estoques quando preços estiverem baixos e venda quando os preços estiverem altos. Estes estoques seriam compostos pelo incentivo ao pequeno produtor, ao setor formado a partir das zonas de assentamento da reforma agrária e da agricultura familiar, conforme a proposta do professor Walter Belik, um dos criadores do Programa Fome Zero. Isso é obra da política e faz parte do contrato social que estabelecemos, que diz respeito ao nosso destino comum.


Imediatamente, o estabelecimento de um programa de transferência de renda de mais longo prazo, não atrelado ao calendário eleitoral, se faz urgente.


O Auxílio Brasil é uma saída paliativa, de alcance restrito e que dá mostras de ser eleitoreira. Aparece desvinculada de medidas efetivas para vencer a fome e proteger, de fato, os vulneráveis. Mas é necessária.


Hoje, infelizmente, para além do governo, falta uma elite política que se mostre disposta a coordenar um esforço para livrar o país e o povo de seus flagelos. Isto envolve custos econômicos e políticos que poucos parecem dispostos a arcar. E que recaem sobre a construção de um consenso sobre o futuro: decidir como produzir condições concretas de vida segura e digna para todos na sociedade política desde agora, no curtíssimo prazo, ao custo que for.

O Brasil tem visto crescer a fronteira agrícola e a capacidade produção de alimentos. A fome que nos aflige hoje é ignominiosa, pois deriva de uma escolha política que favorece poucos ao custo do desespero da maioria dos brasileiros. Seu enfrentamento depende de vontade, liderança e uma perspectiva mais generosa.



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